Do relatório “Monitoring media pluralism in the digital era: application of the media pluralism monitor in the European member states and in candidate countries in 2023” (Country report: Portugal)

Conclusões:
Persistem diversas situações críticas no domínio da Proteção Fundamental, tal como salientámos em relatórios recentes do MPM. Em resumo, as nossas principais recomendações dizem respeito à melhoria de práticas e da legislação, mais particularmente nos seguintes casos:
– É importante reverter a questão da criminalização da difamação, que continua a ser um crime público em Portugal, existindo mesmo com possibilidade de prisão. Como sabemos, o contexto europeu continua crítico a este respeito (CMPF, 2019). A própria Comissão Europeia (UE, 2022) tomou posição sobre o assunto, mas nada mudou até agora na legislação portuguesa.

– No que diz respeito ao bloqueio ou filtragem de conteúdos e acesso à Internet, seja por parte do Estado ou de plataformas digitais, no seu conjunto ou somente a conteúdos e serviços online específicos, a nosso ver seria justificada e necessária a criação de uma base de dados centralizada com informação de todos os bloqueios, com total transparência e explicação completa em cada um dos casos alvo de filtragem ou remoção.

– Quando se trata de proteger os denunciantes, os legisladores ignoram não só as recomendações de especialistas e das organizações da sociedade civil, como a TI Portugal por exemplo, mas também as da própria Comissão Europeia. Ao transpor a diretiva de denúncias da UE (EU Whistleblowing Directive) para o direito nacional, Portugal deveria ter aproveitado a oportunidade para dar aos denunciantes a oportunidade de fazer denúncias diretamente às autoridades. Em vez disso, em Portugal, apenas estão protegidas por lei as pessoas que denunciam ou revelam infrações com base em informações obtidas no exercício da sua atividade profissional.

– O jornalismo enfrenta preocupações crescentes. As condições de trabalho dos jornalistas pioraram consideravelmente, com frequentes irregularidades nos pagamentos e insegurança no emprego. As autoridades públicas devem, portanto, prestar especial atenção a estes aspectos, incluindo a necessidade de novos apoios públicos indiretos ao sector dos meios de comunicação social, uma monitorização mais estreita da independência editorial e do respeito pelos padrões profissionais dos jornalistas, bem como a questão da legislação anti-SLAPP.

– No que diz respeito à regulação, é necessária uma melhoria geral do modelo regulatório a vários níveis: reduzindo a dispersão das entidades envolvidas na regulação do sector (além da ERC, estão também envolvidas a ANACOM, a AdC e a IGAC). É necessária ainda uma maior transparência e legitimidade político-institucional na forma como os conselhos de administração das entidades reguladoras são nomeados e, em relação à regulação dos media, redefinir e melhorar o modelo de financiamento daquele que é, para todos os efeitos, ainda “o” regulador dos meios de comunicação social – a ERC.

Existem riscos significativos na área da Pluralidade de Mercado no panorama mediático português. As principais recomendações nesta área são as seguintes:
– Atualizar, o mais rapidamente possível, o enquadramento regulamentar. Uma nova lei dos meios de comunicação social deve considerar tanto os intervenientes tradicionais como os digitais e centrar-se na prevenção da concentração excessiva dos media.

– A Diretiva (UE) 2019/790 foi finalmente transposta para a legislação portuguesa mas existiram alguns erros de implementação que precisam de ser corrigidos.

– Numa perspetiva económica, o impacto da inflação e dos custos elevados representa uma ameaça para os meios locais e regionais. Políticas públicas novas e criativas devem ser implementadas.

– No contexto da recente crise do grupo Global Media, as práticas gerais de transparência devem ser reforçadas. Devem ser evitados potenciais conflitos de interesses de novos proprietários que ponham em perigo a liberdade editorial das organizações de comunicação social.

A Independência política está ameaçada pela precariedade do emprego, pelos baixos salários, pelo esvaziamento das redacções e por rotinas de trabalho pouco criativas que minam a capacidade do jornalismo para escrutinar o poder político e financeiro através de reportagens de investigação. Recomendamos as seguintes medidas:
– O Estado deve organizar um pacote sustentável de medidas de apoio aos media, visando em particular os sectores mais vulneráveis, nomeadamente os media locais e regionais;

– O futuro da Lusa deve fazer parte de uma política pública estruturada de apoio aos media, uma vez que a agência noticiosa presta um serviço público inestimável e serve as comunidades locais num contexto de crescentes desertos de notícias e aumento da desinformação;

– A política pública de apoio aos media deve alinhar-se com o Plano de Ação para a Democracia Europeia, incluindo o regulamento sobre a transparência e o direcionamento da propaganda política, destinado a combater a manipulação da informação e a ingerência estrangeira nas eleições, bem como a proposta legislativa para proteger a liberdade de imprensa (Media Freedom Act).

No domínio da Inclusão Social, e tendo particularmente em conta o risco elevado dos indicadores Media locais/regionais e comunitários e Igualdade de género nos media, recomendamos:
– A proteção e a promoção da sustentabilidade económica do jornalismo local para evitar o crescimento de desertos de notícias, bem como o reconhecimento legal dos media comunitários, visando fomentar a sua viabilidade e independência;

– O desenvolvimento de políticas públicas concretas e sistemáticas em matéria de igualdade de género e de representação das minorias nos media;

– A promoção de iniciativas de literacia mediática dirigidas a grupos vulneráveis e a implementação efetiva do Plano Nacional de Literacia Mediática;

– A promoção de uma estratégia nacional de combate às desordens informativas e de prevenção do discurso de ódio online.

Nota: publicado sob licença CC Attribution 4.0 International