Relatório final da CPI da Pandemia aponta existência de organização estruturada com o objetivo de disseminar desinformação sobre a Covid-19
A 20 de Outubro, o relator da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia, o senador Renan Calheiros (MDB/AL), entregou ao Senado Federal o seu relatório final. No documento, o relator afirma que a investigação da CPI reuniu elementos que evidenciam:
“(i) a omissão do governo federal na conscientização da população acerca da pandemia;
(ii) a participação efectiva do presidente da República, seus filhos e o primeiro escalão do governo na criação e disseminação das informações falsas;
(iii) o uso da estrutura governamental para promover essas declarações do presidente;
(iv) suporte a comunicadores que propagam notícias e informações falsas sobre covid-19”.
O relatório aponta, também, para a existência de uma organização estruturada com o objetivo de disseminar desinformação contra medidas sanitárias, contra membros do Supremo Tribunal Federal (STF) e contra a lisura do processo eleitoral.
De acordo com o documento, essa organização seria formada por cinco núcleos: um de comando; um formulador; um político; um de produção e disseminação das fake news; e um de financiamento. O núcleo de comando seria composto pelo presidente Jair Bolsonaro e os seus três filhos, Flávio, Carlos e Eduardo. O segundo núcleo, o formulador, seria formado por elementos do gabinete da Presidência da República, que ficou conhecido como “Gabinete do Ódio”. O núcleo político, composto por parlamentares e líderes religiosos, daria suporte às decisões do comando. Os dois últimos núcleos seriam formados por pessoas que não faziam parte do governo, como sites de notícias, “influencers” e empresários.
Por fim, o relatório acusa a existência de uma “campanha de desinformação institucional” realizada pela Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom).
Relator da CPI inclui proposições legislativas entre recomendações
Também no dia 20, o relator da CPI da Pandemia, o senador Renan Calheiros, apresentou duas propostas legislativas para o “combate à elaboração e divulgação de notícias falsas”.
Crime de notícias falsas. A primeira proposta apresentada pretende incluir no Código Penal o crime de “criação ou divulgação de notícia falsa”. O Projecto de Lei (PL) pretende tipificar o acto de criar ou divulgar “notícia que sabe ser falsa para distorcer, alterar ou corromper gravemente a verdade sobre tema relacionado à saúde, à segurança, à economia ou a outro interesse público relevante”. O texto define notícia falsa como texto, áudio, vídeo ou imagem não ficcional que, considerada a sua forma de veiculação, “tenha o potencial de ludibriar o receptor quanto à veracidade do fato”. A proposta também traz uma forma qualificada relativa à saúde pública. As penas chegam a quatro anos de prisão, podendo ser duplicadas.
Medida cautelar penal de remoção de notícia falsa. O texto propõe também alterar o Código de Processo Penal para incluir como medida cautelar diversa da prisão a obrigação de retirar das redes sociais e meios de comunicação a publicação de notícia falsa que atente contra a saúde, a segurança, a economia ou outro interesse público relevante.
Identificação de utilizadores mediante CPF. O segundo PL apresentado pretende alterar o Marco Civil da Internet (MCI), para obrigar os fornecedores de redes sociais a identificar os utilizadores através do Cadastro de Pessoa Física ou do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ).
Obrigações contra a desinformação. Outro dispositivo também obrigaria os fornecedores a adoptarem medidas contra a desinformação; entre as medidas listadas está a remoção imediata de conteúdo publicado por um utilizador não identificado, a proibição de contas automatizadas não identificadas e a desmonetização relativa “a divulgação de notícia falsa ou o uso de perfil fraudulento”. O não cumprimento das disposições levaria à aplicação das punições do artº 12 do MCI, que inclui a proibição de tratamento de dados pessoais no Brasil.
COAF. Além disso, os fornecedores de aplicações ficariam sujeitos a obrigações impostas a entidades fiscalizadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).
* Artigo adaptado do InternetLab (CC BY 4.0). Foto: Thandy Yung/Substack.