O campo da inteligência artificial (IA) teve um progresso notável nos últimos cinco anos e está a causar um impacto real no mundo das pessoas, instituições e cultura. A capacidade dos programas de computador de executarem tarefas sofisticadas de processamento de imagem e de linguagem, problemas centrais que impulsionaram esta disciplina desde o seu nascimento na década de 1950, avançou significativamente. Embora o estado actual da tecnologia de IA ainda esteja muito aquém da aspiração fundacional deste campo de recriar inteligência totalmente humana em máquinas, as equipas de investigação e desenvolvimento estão a aproveitar esses avanços e a incorporá-los em aplicações para a sociedade. Por exemplo, o uso de técnicas de IA na área de saúde está a tornar-se uma realidade, e as ciências do cérebro são tanto beneficiárias quanto contribuintes para os avanços da IA. Empresas novas e antigas estão a investir dinheiro e atenção em graus variados para encontrar maneiras de aproveitar esse progresso e fornecer serviços numa escala sem precedentes.
Os sucessos neste campo levaram a um ponto de inflexão: agora é urgente pensar seriamente sobre as desvantagens e os riscos que a ampla aplicação da IA está a revelar. A capacidade crescente de automatizar decisões em escala é uma faca de dois gumes; “deepfakes” intencionais ou algoritmos simplesmente inexplicáveis que fazem recomendações de missão crítica podem resultar em pessoas a serem enganadas, discriminadas e até mesmo fisicamente prejudicadas. Algoritmos treinados com dados históricos são dispostos para reforçar e até mesmo exacerbar os enviesamentos e desigualdades existentes. Considerando que a investigação em IA tem estado tradicionalmente na alçada de cientistas da computação e investigadores que estudam os processos cognitivos, tornou-se claro que todas as áreas da investigação humana, especialmente as ciências sociais, precisam de ser incluídas numa conversa mais ampla sobre o futuro do campo. Minimizar os impactos negativos na sociedade e aumentar os positivos requer mais do que soluções tecnológicas únicas; manter a IA no caminho para ter resultados positivos relevantes para a sociedade requer envolvimento e uma atenção contínua.
Olhando para o futuro, uma série de passos importantes precisam de ser dados. Os governos desempenham um papel crítico na definição do desenvolvimento e aplicação da IA e têm-se ajustado rapidamente para reconhecer a importância da tecnologia para a ciência, a economia e o processo de se governarem a si mesmos. Mas as instituições governamentais ainda estão atrasadas e será necessário um investimento sustentado de tempo e recursos para enfrentar os desafios colocados pela tecnologia em rápida evolução. Além de regulamentarem os aspectos mais influentes das aplicações de IA na sociedade, os governos precisam de olhar para a frente para garantir a criação de comunidades informadas. Incorporar a compreensão dos conceitos e implicações da IA na educação [entre os 5 e os 12 anos] é um exemplo de uma etapa necessária para ajudar a preparar a próxima geração para viver e contribuir para um equilibrado mundo com IA.
A própria comunidade de investigação da IA tem um papel crítico a desempenhar a esse respeito, aprendendo como partilhar tendências e descobertas importantes com o público de formas informativas e activas, sem exageros e sendo clara sobre os perigos e as consequências indesejadas, juntamente com as oportunidades e os benefícios. Os investigadores de IA também devem reconhecer que a autonomia completa não é o objectivo final dos sistemas de IA. A nossa força como espécie vem da nossa capacidade de trabalhar em conjunto e realizar mais do que qualquer um de nós poderia fazê-lo sozinho. A IA precisa de ser incorporada nesse vasto sistema comunitário, com linhas claras de comunicação entre decisores humanos e automatizados. No final, o sucesso deste sector será medido pela forma como se deu poder a todas as pessoas, não pela eficiência com que as máquinas desvalorizam as pessoas que estamos a tentar ajudar.
Conclusões do “Gathering Strength, Gathering Storms: The One Hundred Year Study on Artificial Intelligence (AI100) 2021 Study Panel Report“, Stanford University (CC)