Em Março passado, ficou-se a saber que uma entidade desconhecida queria contratar jornalistas portugueses para escreverem sobre as vacinas anti-Covid. O assunto chegou à Assembleia da República e à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) sem qualquer resultado. Agora, e tal como em Portugal, são influenciadores a afirmar em França terem sido assediados para fazer o mesmo.

O “youtuber” Leo Grasset, com mais de um milhão de seguidores no YouTube, foi um de vários utilizadores nas redes sociais a receber e recusar uma oferta para denegrir as vacinas anti-Covid. Um médico terá tido uma oferta semelhante de 2.000 euros para um vídeo online de 30 segundos.

Esta era proveniente de uma “misteriosa agência de publicidade” Fazze (existe uma em fazze.com, dedicada ao “influencer marketing”) a favor de um “cliente que prefere manter-se incógnito”, revelou a Associated Press.

A oferta chegou igualmente a outras pessoas conhecidas no Twitter, Instagram e outras plataformas. Na explicação dada, referia-se uma “campanha de informação” sobre “as vacinas oferecidas à população europeia, nomeadamente a AstraZeneca e a Pfizer”.

“Nós, criadores do YouTube, da Internet, do Instagram etc., estamos no centro de algo que está a acontecer como uma guerra da informação”, referiu Grasset. “Como criadores, precisamos de colocar os nossos padrões realmente elevados porque isto é, acho eu, apenas o começo”.

Em Portugal, uma alegada campanha terá visado a comunicação social, tendo sido denunciada em “O jornalismo sobre a covid-19 é corrupto?“, título de um texto de Pedro Tadeu, publicado no Diário de Notícias a 3 de Março.

O jornalista revelou a existência de um anúncio na rede LinkedIn para contratar um repórter para “assegurar a elaboração de reportagens, entrevistas, num tema específico relacionado com saúde, desenvolvendo investigação, reportagens e entrevistas”.

Posteriormente, terá tido conhecimento de mais dois “anúncios parecidos”, cujo objectivo era ter jornalistas na redacção com “poder” para publicarem conteúdos sobre a pandemia nos meios de comunicação social, tendo como foco a “contabilização de números de mortos, número de infectados e níveis de contágio”, o trabalho e custos dos hospitais privados. “Quantas mais reportagens conseguisse publicar”, mais ganhava.

A partir disto, Tadeu refere que, “ao que parece, está montado um sistema de contratação, por entidades estranhas ao jornalismo, de jornalistas que estejam a trabalhar em redações para impingir nos seus jornais, rádios ou televisões matérias que, embora sejam baseadas na realidade (ninguém pediu para mentir), fossem capazes de alterar a linha editorial desses órgãos de informação”.

No dia seguinte, o Dinheiro Vivo, do mesmo grupo do DN, intitulava um artigo “Descobrimos quem quis contratar jornalistas para manipular sobre covid. Diz que a ideia não foi sua“. Segundo a descoberta, seria um aluno da Universidade do Porto, “jovem modelo que pertence a [um] grupo anti-5G” e cujo “objectivo era dar um lado da pandemia que não aparece falado na comunicação social tradicional”.”Fui só um intermediário, sou um estudante universitário e fui contratado para isso, mas não digo para quem”, revelando que “a vaga já foi preenchida”.

Ambos os jornalistas da Global Media foram depois ouvidos em audição conjunta das comissões parlamentares de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e da Cultura e Comunicação. A presidente desta última comissão, Ana Paula Vitorino, afirmou que “o assunto será analisado numa próxima reunião para saber ‘o que fazer’“.

Por seu lado, numa audição semelhante em Abril, a ERC admitiu ainda não ter recebido queixas sobre este tipo de “anúncios a contratar jornalistas para notícias tendenciosas sobre Covid-19”.

O presidente da entidade reguladora, Sebastião Póvoas, assegurou que se “detectar ‘alguma violação por parte dos órgãos de comunicação social’ agirá”, e poderia mesmo requerer a “intervenção de outras entidades como o Ministério Público ou da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista ou do Sindicato dos Jornalistas”.