Chamam-lhes “news avoiders” ou “evitadores de notícias”. Em Portugal, há uma percentagem considerável de pessoas que não parecem interessar-se pelas notícias, nomeadamente em ambiente académico.

A conclusão é de Maurício Matos, na sua dissertação de Mestrado “Notícias? Não, obrigado. As reações de uma comunidade de news avoiders em Portugal” (2020), baseada nas respostas de 478 alunos de licenciatura e mestrado da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa a um inquérito que decorreu entre 25 de Novembro e 27 de Dezembro de 2019.

É “perceptível um índice considerável de ‘news avoidance’ entre todos os estudantes que responderam ao inquérito”, com os resultados a ficarem acima das médias nacional e internacional do Digital News Report 2019 (DNR).

Os estudantes das licenciaturas de Sociologia e de Línguas e também de Literaturas e Culturas posicionaram-se como os mais desinteressados (52,3%), “o que pode levantar a questão se há alguma especificidade colectiva semelhante entre os estudantes destes dois cursos em relação às notícias”.

Em geral, “o impacto negativo no humor, a desconfiança na veracidade da informação e o sentimento de incapacidade diante da realidade” são as principais razões para o desinteresse pelas notícias. Os principais descrentes nas notícias são de direita em termos de opção política e mulheres.

O autor considera que “o afastamento das notícias leva a uma menor compreensão da realidade e, por consequência, pode levar também a tomadas de decisões de menor qualidade, face a uma prejudicada distinção de prioridades e de necessidades”.

Um grupo de “hard-core news avoiders” – que “agem deliberadamente para não ter contacto não intencional com informação jornalística” – sobressaiu no estudo, com 37 estudantes a dizer que evitam notícias “frequentemente” e 177 que o fazem “às vezes”.

A análise é feita para uma audiência “fragmentada”, que não se vincula como antes à imprensa ou à televisão, mas usa os meios digitais. “Este novo ambiente de media, no qual há uma maior e mais variada oferta de conteúdo, constitui-se um desafio para a manutenção e crescimento do consumo de notícias”, embora no caso português mais de 80% tiveram contacto com a televisão em 2018, nomeadamente “as mulheres, os idosos (indivíduos com mais de 64 anos) e pessoas das classes sociais D e E”, que olharam para este ecrã numa média diária de 4 horas e 43 minutos.

Curiosamente, ainda para esse ano atípico devido ao Mundial de Futebol, os 10 programas mais vistos nos canais generalistas foram de desporto. Excluindo estes, o programa mais visto foi um Telejornal mas com 69,2% das peças jornalísticas relacionadas com aquele Mundial.

O contacto com a imprensa em papel “corresponde a uma média diária de 4,4 milhões de indivíduos”, principalmente os homens entre os 35 e os 44 anos das classes sociais médias. Abaixo dessa faixa etária, impõe-se a Internet, mesmo à frente da televisão.

Relativamente aos conteúdos online, o jornalístico este chega aos 82,8% e é apenas ultrapassado pela pesquisa de informação sobre produtos ou serviços.

Esse estudo aponta ainda que 32% da população em 38 países “evitam notícias activamente”, algo semelhante ao que se passa com um terço (31%) em Portugal.

O DNR 2019 nota que a “idade não tem sido uma nuance determinante para o afastamento das notícias, ao contrário do que o senso comum geralmente aponta como sendo uma tendência maior entre os mais jovens”. Mas são novamente as mulheres que mais as evita.

Em termos de “culpas”, os entrevistados apontaram o efeito negativo no humor ao terem contacto com conteúdo jornalístico (58%); a impotência de nada poderem fazer (40%), enquanto 34% não confia na veracidade das notícias.

Mas os dados do DNR apontam para outra incongruência, com Portugal a ser o segundo país em termos da confiança nas notícias (58%) enquanto ocupa também a segunda posição em termos de maior preocupação com as notícias falsas na Internet (75%). Num resumo muito simplista, as notícias na Internet parecem menos verdadeiras, ao contrário do que sucede na televisão.

Foto: Bill Strain (CC BY 2.0)