“Os espaços online estão a ser sistematicamente armados para excluir as líderes femininas e minar o papel das mulheres na vida pública”, alerta o recente relatório “Engendering Hate – the Contours of State-Aligned Gendered Disinformation Online“, do think tank Demos.
Os ataques às mulheres, com “linguagem odiosa, boatos e estereótipos de género combinam ataques pessoais com motivações políticas” e, desta forma, “tornam os espaços online em lugares perigosos para as mulheres se manifestarem”.
Os investigadores do Demos analisaram as mensagens na rede social Twitter em dois países, Polónia e Filipinas. Eles detectaram como
– a desinformação por género é partilhada online por actores alinhados com os estados – embora atinja públicos muito mais amplos,
– a maneira como a desinformação de género se espalha numa rede varia enormemente de acordo com o contexto, embora os seus temas costumem ser amplamente consistentes,
– esta desinformação “parasita” as notícias, rumores e estereótipos sociais subjacentes, procurando reformular os termos do discurso político por forma a prejudicar as mulheres.
A expressão “alinhado com o estado” visa “a desinformação criada e partilhada não apenas por aqueles que podem ter sido coordenados directamente pelo governo, mas também por redes informais de actores que usam a desinformação de género para tentar proteger o estado de críticas ou ameaça democrática, em particular pelas mulheres na vida pública”.
Os investigadores referem ainda como “a desinformação de género não é apenas informação falsa – ela usa conteúdo altamente emotivo e carregado de valor para tentar minar os seus alvos” – e “constitui uma arma de assédio contra as mulheres na vida pública e tenta fazer com que tenham medo de responder”, embora isso não tenha desincentivado as mulheres de participarem na vida pública.
A importância desta questão na luta contra a desinformação tem várias vertentes e “não deve ser negligenciada nas respostas à desinformação em geral”. Também “as soluções automatizadas centralizadas para a desinformação de género tendem a censurar o discurso legítimo e a ignorar” esta desinformação, quando “devem centrar-se e aprender com as experiências das mulheres que já estão trabalhando para desafiar a desinformação”.
As “regras” para atacar as mulheres podem ser agrupadas em:
– convencer os outros de que as mulheres são tortuosas: elas não são adequadas para a política,
– denunciar as mulheres como estúpidas demais para a vida pública,
– fazer com que as mulheres tenham medo de responder,
– elogiar as mulheres por serem sexy, condená-las por serem sexuais,
– mostrar que os homens fortes irão salvá-las,
– demonizar os valores que elas têm.
Os autores do estudo apontam como este tipo de linguagem e de narrativas pretendem alcançar objetivos políticos, nomeadamente “na exclusão sistemática das mulheres do poder político” e, simultaneamente, enviar “uma mensagem de que as mulheres em geral não se devem envolver na política: é muito arriscado, muito perigoso, muito inadequado, muito prejudicial para um estado”.
Nas recomendações, eles alertam para a necessidade de reconhecer a diversidade da desinformação, que esta não é apenas um problema de género e deve ser enquadrada e contextualizada. “As plataformas devem apoiar o trabalho de especialistas locais na identificação e combate à desinformação de género, por exemplo, através do fornecimento de acesso a dados ou do teste de respostas potenciais por meio de mudanças no design da plataforma”. Por fim, “as soluções devem ser criadas em conjunto com pessoas que foram alvos de desinformação de género, para garantir que as ameaças mais significativas são abordadas de uma forma que não complica o problema”.
Não se pode generalizar esta conclusão, muito menos torná-la em “alerta máximo” como fundamento para deflagrar um verdadeiro movimento revolucionário nesse sentido. Seria como “chover no molhado”, visto que tal situação já faz parte (histórica, milenar) das diferenças inter-sexos, havendo se tornado “usos e costumes” na sociedade humana. Situação similar ocorre entre diferenciação de raças, sexos, cores de pele etc.
Assim, a melhor estratégia para se combater essa excrescência social é simplesmente ignorá-la, a fim de não incentivar, não realimentar a celeuma, qualificando-a como um “erro de projeto” (J.Koffler, 1976) a mais, dentre os tantos já sobejamente discutidos.