O Jornal de Notícias (JN) apontou esta quinta-feira os “sinais de restrição no acesso às fontes e no direito de informação” oficiais, a propósito de uma conferência de imprensa da ministra da Justiça, replicando dificuldades em eventos semelhantes da Direção-Geral da Saúde (DGS) ou do Conselho de Ministros.
A situação pandémica tem servido para este tipo de acções, referidas diversas vezes desde a entrada em vigor do decreto presidencial de 18 de Março para o estado de emergência. O documento é claro: “os efeitos da presente declaração não afectam igualmente, em caso algum, as liberdades de expressão e de informação”.
No entanto, as queixas contra as violações destas liberdades surgiram nesse mesmo mês, quando o PEV questionou o Governo “sobre jornalistas estarem a ser impedidos de fazer o seu trabalho por falta de colaboração das entidades oficiais”, exemplificando com uma denúncia do Sindicato dos Jornalistas (SJ) sobre a “falta de colaboração das entidades oficiais” e até ilegalidades na postura com a comunicação social.
O SJ apontava situações como as ocorridas em Pombal (presidência eleita pelo PPD/PSD), Ourém (coligação PSD/CDS) ou em Leiria (PS). Os jornalistas alertaram também para “dificuldades na confirmação de dados juntos dos serviços de saúde pública” ou de “reuniões de Câmara passarem a ser realizadas por videoconferência”, sem questões dos jornalistas.
A situação nas conferências de imprensa da DGS foi diferente mas as tentativas para as condicionar pareceram óbvias.
Falta de colaboração resolvida por informação
Em Maio, Pedro Jerónimo recordou que, “quando vemos o Ministério da Saúde e a DGS a demorar quase dois meses para permitir o acesso dos jornalistas dos media regionais às conferências de imprensa diárias ou demais ministérios ou organismos públicos a tratarem de forma diferenciada os profissionais, dependendo do meio para o qual trabalham, não estamos a zelar por comunidades informadas”.
O investigador dos media falava da “falta de colaboração” das fontes oficiais, que obrigou o SJ a “informar” o referido ministério “sobre o que poderia configurar uma desigualdade de tratamento no acesso à informação, depois de ter sido alertado por dois órgãos de informação regional, excluídos das referidas conferências de imprensa” – situação resolvida uma semana após esse contacto.
O PSD não deixou cair as acusações. A 18 de Agosto, Duarte Marques escreveu que “as possibilidades de questionamento dos jornalistas nas conferências de imprensa após as reuniões do Conselho de Ministros e nas conferências da DGS continuam altamente limitadas, como se o Estado de Emergência se mantivesse”.
O deputado estranhava ainda o “silêncio” do SJ “perante a perpetuação deste entrave ao trabalho dos profissionais de comunicação social”.
No dia seguinte, o SJ considerou que já se podia “acabar com excepções pensadas para o estado de emergência”, quando “um pouco por todo o país ‘há uma tentação do poder’ para aproveitar a pandemia e ‘prolongar excepções'”.
Uma fonte não identificada do Governo explicou que “as regras se mantêm em vigor porque as conferências de imprensa acontecem em Lisboa, onde o estado de contingência continua a limitar os ajuntamentos a um máximo de 10 pessoas”.
Segundo a revista Sábado, essas regras passam por “antes de cada conferência de imprensa, os jornalistas recebem um mail com as regras em vigor”. A sessão de perguntas e respostas é presenciada pela RTP (“que cede o sinal a quem o solicitar”) e a agência Lusa (para texto e fotografias). Em regime rotativo, podem ainda estar presentes uma televisão privada (SIC, TVI ou CMTV), uma rádio nacional de informação, um jornal generalista e um outro online.
Os meios não presentes fisicamente na sala “podem pedir por e-mail para aceder à conferência via Zoom” mas antes decorre “um sorteio para que possam fazer duas perguntas”, desconhecendo-se como se processa esse sorteio e quem é “premiado”.
É uma injustiça, é o que é…
Perante as acusações, o Governo assegurou esta quinta-feira que o “formato” dessas conferências “não afectou a liberdade de imprensa”.
A ministra de Estado e da Presidência respondia assim às críticas do PSD, alegando que a “liberdade de imprensa é um tema demasiado sério” para poder ser usado “só porque dá um bom título”.
Mas a ministra da Justiça tratou de desfazer essa afirmação ainda ontem. O JN escreveu em editorial que, na apresentação da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção 2020-2024, se viu “impedido de estar presente, bem como outros órgãos de informação”.
O ministério alegou que as recomendações de distanciamento social permitiam não só “limitar o número de participantes” na conferência de imprensa, como “seleccionar” os órgãos de comunicação social presentes, e até impossibilitar “perguntas à distância, apesar das múltiplas ferramentas tecnológicas que actualmente o permitem”.
O JN recordou que “os sinais de restrição no acesso às fontes e no direito de informação não são novos”, exemplificando com as conferências de imprensa da DGS ou do Conselho de Ministros que “impõem números restritos de presenças, embora num sistema rotativo que assegura um acesso equitativo de todos os meios de comunicação, sejam eles nacionais ou regionais”.
Esta não foi a opção da ministra van Dunem, demonstrando como perante a “tentação do poder” em usar a pandemia como forma de “prolongar excepções”, está na altura de desconfinar a comunicação social – à semelhança de outros sectores económicos e culturais.
[act.: O Sindicato dos Jornalistas “vai pedir audiências ao Presidente da República, ao Tribunal Constitucional e ao Ministério da Justiça, que esta semana escolheu os Órgãos de Comunicação Social que quis para uma conferência de imprensa de apresentação da estratégia de combate à corrupção 2020-24”.]